Estreou hoje o Leão da Estrela versão 2015. E eis senão quando se erguem os intelectuais do costume a lançar farpas em defesa do sagrado - a versão 1947 - versus o profano - a versão de Leonel Vieira.
A critica no jornal Público, de Jorge Mourinha é um bom exemplo, logo a começar pelo titulo: Para quem é, bacalhau basta.
Então vamos esclarecer uns pontos...
PRIMEIRO: quem nunca tiver visto tanto "O Leão da Estrela", como o anterior "Pátio das cantigas" e, o posterior na fila de delapidação, "O Pai Tirano", ficará com a ideia de que os originais eram filmes não popularuchos, já que o popularucho parece ser sinónimo de medíocre, segundo tão imponente crítica.
Estará o critico a partir do principio que quem tinha acesso aos cinemas na altura era uma minoria, logo essa elite (composta por aristocratas e pato bravos) fosse a epítome do panorama cultural da época? E se me vem dizer que o Pátio das Cantigas original (por exemplo) é o protótipo consumado desse elitismo, desculpem, mas O Critico (as maiúsculas remetem-no ao plural, já que há mais quem assim pense) não viu o mesmo filme que eu.
Uma das grandes mais valias deste cinema português, foi precisamente conseguir tocar as massas. Não havia ninguém, independentemente da classe social, nível intelectual ou etário, que não se identificasse com algum personagem, que não acompanhasse com facilidade os enredos simples. Essa é a grande virtude do cinema português dos finais dos anos quarenta. E se foi, com toda a certeza, difícil contornar o lápis azul, o environnement do humor usado era o do teatro de revista, a piada fácil mas, censura oblige, algo espartilhada.
Conclusão: os filmes originais sempre foram POPULARES, sempre tiveram essa intenção.
SEGUNDO: analisemos pois a 'labreguice' de que o critico do Ípsilon acusa Leonel Vieira. A substituição do 'humor teatral e de revista' por este, aparentemente de telenovela. Indo por partes: eu não ia à revista em 47. No entanto fui ao Parque Mayer nos anos setenta (sim, era pequena, nasci em 67, mas os meus pais gostavam de se fazer acompanhar pela benjamim) vezes suficientes para reconhecer que o tipo de humor dos originais é revisteiro. Mais, posso garantir a pés juntos que a brejeirice revisteira não está em nada acima da alegada cultura de novela que baliza o(s) filme(s). Muito antes pelo contrário, lembro-me do desconforto que às vezes sentia na plateia do Maria Vitória, do ABC... e do desconcerto com que saia das salas...
Conclusão: se estes filmes apelam aos labregos, ou ao lado labrego que existe em cada um de nós (devida exceção feita ao critico, com minúscula e maiúscula), remetamo-nos à conclusão do primeiro ponto, e chegaremos à inevitável conclusão. os originais também apontavam ao mesmo alvo.
Para terminar, não posso deixar de comentar a pérola de estilo do critico que é: "(...) revela aí também a sua pobreza conceptual, o seu cinismo hipócrita e merceeiro(...)". Aliás, nem comento, porque não o merece.
O Leão da Estrela aí está, na sequência d'O Pátio das Cantigas, e na antecipação d'O Pai Tirano. As salas vão voltar a encher para ver cinema falado na nossa língua, realizado e protagonizado por gente daqui do burgo. Na plateia hão-de haver gargalhadas provocadas por lugares-comum, por alguma brejeirice, por disparates que não querem outra coisa senão fazer rir. Porque às vezes a arte - seja ela a literatura, as artes plásticas ou o cinema - tem apenas essa finalidade: divertir quem a vê como divertiu quem a fez.
Porque as coisas (sendo elas quais forem) não devem ser levadas demasiado a sério.