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Porque Eu Posso 2.0

... e 'mái nada!

Porque Eu Posso 2.0

... e 'mái nada!

Ex.mo Senhor Primeiro Ministro:

 

Acompanhei, como todos os meus co-cidadãos, os incêndios de Pedrógão, em junho passado, aterrada, incrédula. As 65 vítimas foram 65 a mais. Demasiadas e obviamente escusadas. Vi e ouvi pedirem a cabeça da MAI, e achei precoce. Juro que achei.

 

Em julho e agosto, Portugal continuou a arder. O segundo Grande Incêndio de Mação, lembra-se? Um concelho, tido como o pulmão de Portugal, em cinzas. Pessoas desalojadas, mas perigos maiores evitados: a tragédia não fez vítimas mortais entre os civis; só alguns se limitaram a perder vidas inteiras de trabalho, outros a necessitar de dezenas de anos para voltar a recuperar cultivos que são o seu sustento - mas isso é normal e expetável nestas circunstâncias, decerto achará. Só na mesma região (não mencionando as outras todas...) no final da segunda semana ardia Abrantes - e tanto mais. Nas últimas duas semanas de Agosto, o que ainda não tinha ardido em Mação, ardeu. Vila de Rei começou a arder, o fogo atravessou o Tejo e chegou a Niza.

 

Agora, a 30 de setembro, com temperaturas anormalmente elevadas para a época, dá-se a fase Charlie por encerrada o que resulta em que se

 

  • encerrem centros de vigia e controle/prevenção das/nas florestas;
  • cessem os contratos de aluguer dos meios aéreos de combate aos incêndios;
  • descomissionem-se ativos em serviço, porque passou a época de risco. 

 

- como se a época de risco olhasse para o calendário, e decidisse que era altura de fazer as malas e mudar-se para outras paragens...

 

A 15 de Outubro, de novo o Inferno; agora não se pode desculpar com o clima: pelo menos desta vez haviam indícios claros e explícitos de que existiriam condições climatéricas para se desenvolver uma situação como esta... mas somos sempre uns otimistas, um raio não cai duas vezes no mesmo sitio, só acontece aos outros, e clichés semelhantes, não é?

 

Pois não, não é. Quarenta e duas pessoas perderam a vida no meio de um inferno de labaredas. OUTRA VEZ.

 

A arrogância, a falta de humildade e mesmo de humanidade que mostrou nos últimos dias envergonham-me. Envergonham-me profundamente e repugnam-me.

 

O senhor está a esquecer-se que governa quem e PARA QUEM o colocou onde está - e não se agarre aos resultados das autárquicas, que eu sou uma das cidadãs que no dia 1 de Outubro lhe deu um voto de confiança; fossem as autárquicas agora, a 22, e não daria, porque neste momento eu não confio. E não sou, nem de longe, a única.

 

Retiro aqui simbolicamente o voto de confiança que lhe dei há duas semanas atrás, e mais digo que a haver um levantamento popular como na Galiza, serei das primeiras pessoas a dirigir-me para o lugar indicado. É vergonhoso, desumano, não assumir responsabilidades, não pedir desculpa pela parte que vos toca, Governo que nos representa e a quem cabe proteger-nos, no que falharam rotundamente por duas calamitosas vezes.

 

Retire-se, senhor Primeiro Ministro. Retire-se para um gabinete com um espelho bem grande, onde possa estar sozinho. Reflita sobre tudo o que se passa, sobre tudo o que ouve, lê. Sobre o que sente. Ponha tudo em perspetiva. Depois olhe para o espelho e decida se gosta do que vê. 

 

Saia desse espaço e haja em conformidade com as conclusões a que tiver chegado, sabendo de antemão que deste lado está uma imensidão de gente que poderá também agir em consonância com as suas ações.

 

Os portugueses podem ter memória curta,

mas não sofrem de amnésia.

 

Com (cada vez menos) consideração,

 

Fátima Bento

 

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