Alguém me explica porque é que nestas coisas de sociedade,
mingling e afins
é tão absolutamente importante a profissão da pessoa com que falamos? Ok, pode funcionar como facilitador no momento em que duas pessoas se conhecem, mas também pode resultar no oposto. É que é um bocadinho difícil estar à altura das expectativas do outro e dizer ah fiz montes de coisas (e eu lá perguntei o que fizeste? ou perguntei o que fazes?), e agora estou em casa com os miúdos - por exemplo, de modo a que o outro consiga entender que
- não nascemos mães,
- não fomos obrigadas a ser mães,
- nem ficámos em casa porque não queremos fazer nenhum.
Mas noves fora nada, redunda nisso. Podes ter um pós doutoramento em física nuclear, que se estás em casa com os miúdos, não fazes nada. Pior: não queres fazer nada. Pior ainda: eu sei lá se tem sequer uma licenciatura, quanto mais um pós doutoramento! Não quer é fazer nenhum!
Pode parecer que estou a ser redutora, mas não estou. Em determinados círculos, se não tens canudo, és transparente. Se tens e estás em casa, é bom que tenhas portfolio que comprove as tuas habilidades profissionais, senão, além de não existires, és preguiçosa.
Senti isso na pele quando optei por ficar em casa com dois filhos na primeira infância. Ah, é dona de casa. E eu, miúda que era, batia o pé e dizia que não, que era mãe a tempo inteiro (por falar nisso, essa definição ainda está no meu perfil do facebook, tenho de alterar), já que nem gostava (e era um zero à esquerda) no que a tarefas domésticas dizia respeito. O que é que interessava se falava cinco línguas, lia que nem um cavalo, tinha um sem número de habilitações técnicas, um bacharelato em design de moda e tinha feito X,Y e Z?... nada. A partir do momento em que decidi ficar em casa deixei de existir. Quando muito, às paginas tantas, era um número no desemprego de longa duração (mas eu não estou desempregada; nem estou à procura de trabalho!) Não interessava. Em todos os documentos, em profissão, punham dona de casa, independentemente. Se refilasse, podiam alterar para desempregada. Porque mãe não é profissão.
Agora, com dois filhos adultos, qual a resposta certa à pergunta de um milhão de dólares? O que é que eu sou? É que isto das profissões quer-se como o ADN: TEMOS DE TER.
Posso dizer que sou blogger - e tenho um ataque de riso a seguir que isso não é profissão. Pelo menos para mim não é.
Posso dizer que escrevo. E a pergunta seguinte é invariavelmente, o que é que já escrevi; muita coisa mas ainda não publiquei nada.
Conclusão?
Não faz nada.
Portanto, a pouco mais de meio de uma vida em que fiz tanto, em que fiz o que gente agarrada ao canudo nem imagina porque só olham para o concernente à profissão e pouco mais, em que sou pós doutorada pela vida - e de que maneira! - em que já fiz omeletas sem ovos vezes sem conta, e já bebi limonadas que dão para um bairro de casas de família, em que fiz o pino e mortais encarpados à retaguarda, oficialmente, não faço nada.
Mas deixem que vos diga: o NADA que faço transborda-me os dias, e não trocava por título nenhum de quem me pergunta e acha que a resposta é vinculativa.
Porque nesses casos, surge-me um meio sorriso irónico nos lábios e viro as costas.
Porque prefiro não fazer nada a ser tão poucochinha...
Dedicado a todas as que, como eu,
não fazem nada.